quinta-feira, 23 de julho de 2009

Temer vai abrir 44 processos administrativos contra servidores por venda de passagens

MÁRCIO FALCÃO
da Folha Online, em Brasília

O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), determinou nesta quinta-feira que a Corregedoria da Casa investigue a participação de deputados na venda da cota de passagens aéreas. Temer decidiu ainda abrir 44 processos administrativos contra servidores e ex-servidores que tiveram o envolvimento na máfia das passagens confirmado pela comissão criada para apurar o comércio de bilhetes aéreos na Câmara.

O comando da Casa decidiu manter em sigilo os nomes dos servidores e dos parlamentares que estão sob suspeita. A Câmara não confirmou se os deputados foram citados ou acusados pelos servidores. Os parlamentares não foram ouvidos porque a comissão de sindicância era formada por funcionários e não possui atribuição para tomar depoimento.

O corregedor da Câmara, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA), vai avaliar o parecer da comissão e decidir se abre processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética contra os deputados. No caso dos servidores, eles podem ser demitidos, enquanto para os ex-servidores a punição seria a proibição para que eles assumam qualquer cargo público nos próximos dez anos.

O presidente da Câmara recebeu hoje, em São Paulo, o material da comissão e decidiu encaminhar uma cópia ao Ministério Público e ao STF (Supremo Tribunal Federal). Segundo a assessoria do peemedebista, o relatório da comissão será mantido em sigilo até o corregedor se manifestar.

A comissão identificou que a máfia das passagens utilizava métodos diferentes para desviar os bilhetes da cota. O mais comum era o funcionário do gabinete vender bilhetes da cota dos parlamentares para agências de turismo. Essas empresas, por sua vez, revendiam as passagens para clientes e repassavam parte dos recursos para funcionários.

As companhias aéreas fornecem aos gabinetes senhas para que possam administrar a cota de passagens via internet. Com posse dos códigos, as agências podiam vender os bilhetes a terceiros.

Temer determinou abertura de investigação para identificar a existência da máfia das passagens depois que os nomes do presidente do STF, Gilmar Mendes, e do ministro Eros Grau apareceram como beneficiários na cota dos deputados Paulo Roberto (PTB-RS) e Fernando de Fabinho (DEM-BA), respectivamente.

Os ministros comprovaram que as passagens não foram custeadas pela Câmara. Mendes encaminhou à Câmara cópia da fatura de seu cartão de crédito que comprovaria que todos os bilhetes foram pagos com recursos próprios em uma agência de turismo. Eros Grau apresentou um comprovante de que sua passagem foi paga pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Anistia

O comando da Câmara decidiu, no mês passado, arquivar a investigação contra o deputado Fábio Faria (PMN-RN), que bancou a passagem da ex-namorada Adriana Galisteu com sua cota, e estendeu a anistia aos demais casos identificados na Casa.

O presidente da Câmara argumentou que se baseou em pareceres jurídicos para arquivar as denúncias contra Faria, e não éticos. "Eu não posso examinar questões éticas. Tem que se examinar pelo foro jurídico. O argumento é que o sistema jurídico anterior permitia esse atenuante."

Reportagem da Folha afirma que a Câmara gastou R$ 150 mil nos dois pareceres contratados para analisar o caso das passagens aéreas. Os pareceres, revelados pelo site Congresso em Foco, foram pedidos para os professores da USP Clóvis de Barros Filho, de ética, e Manoel Gonçalves Ferreira Filho, de direito.

Barros Filho, porém, afirmou à Folha que respondeu apenas a perguntas abstratas, sem referência direta nas questões ao episódio das passagens. "Meu parecer não conclui absolutamente nada sobre as passagens", disse ele. Já Ferreira Filho disse ter concluído que a situação das passagens era "juridicamente correta".

Abuso

A comissão foi criada depois que surgiram as inúmeras denúncias de que parlamentares usaram a cota indevidamente. Entre as denúncias está a utilização da cota por mais de 100 parlamentares que financiaram viagens de familiares ao exterior. Outros deputados financiaram viagens de terceiros sem qualquer vínculo com atividades parlamentares.

Após as denúncias, o comando da Câmara anunciou mudanças no sistema. Pelas novas regras, os bilhetes só poderão ser emitidos em nome dos deputados ou de um assessor credenciado, que precisará de autorização da Terceira Secretaria para viajar.

Se a cota não for utilizada em sua totalidade, o crédito retorna imediatamente para a Câmara. Ficou definido ainda que os parlamentares terão que colocar na internet em 90 dias a movimentação da cota de passagens, informando, por exemplo, o trecho utilizado.

Também foi anunciado uma redução de 20% no valor das cotas de transporte aéreo, que, dependendo do Estado do parlamentar, varia de R$ 3.700 a R$ 14.900. A economia prometida é de R$ 17,9 milhões.

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