BRASÍLIA – Não se discute a oportunidade, a qualidade e a competência de José Sarney para presidir o Senado. Melhor alternativa inexiste para o Congresso. E para o presidente Lula, também.
No entanto... No entanto, com todo o respeito, o ex-presidente iludiu a opinião pública e seus colegas. Porque mil vezes declarou não ser candidato, não admitir a hipótese de voltar à cadeira antes ocupada, manifestando o desejo de empenhar-se prioritariamente a escrever livros. Ao próprio Lula foram três negativas antes que o galo cantasse. Pois agora cantou, anunciando sua volta ao terreiro.
É claro que em política tudo muda, valendo o império das circunstâncias e prevalecendo o fato novo e o fato consumado. Mesmo assim, fica difícil conciliar a recusa com a aceitação. Ainda mais quando o senador sustentava que não disputaria o cargo. Vai disputar, pelo menos se Tião Viana cumprir a promessa de bater chapa. Adiantará muito pouco, já que PMDB, com uma exceção, PSDB, DEM, PTB e outros partidos fecham com Sarney, dispondo de 58 votos em 81, e caminhando para ampliar esse número.
Discute-se, agora, o efeito da decisão tornada pública esta semana nas eleições para a presidência da Câmara. Porque Michel Temer tinha sua escolha garantida com base na reciprocidade. O PMDB dirigiria os deputados e o PT, os senadores. A bancada peemedebista no Senado estrilou, por ser majoritária, e o acordo com os companheiros foi para o espaço. Deverão os deputados do PT votar no presidente do PMDB, sabendo da rasteira passada em seus senadores? Fica difícil supor Michel Temer derrotado, afinal ele já dispunha de mais de 400 votos, entre 513. Seria bom, porém, que ele tomasse cuidado e refizesse as contas.
A candidatura de José Sarney cria outro problema. Mesmo parecendo fórmula ideal para o palácio do Planalto, deixa o presidente Lula em dificuldades frente a seu próprio partido. Ou já não havia manifestado apoio a Tião Viana? Cruzará os braços? Trabalhará contra Sarney, ao menos retoricamente?
A concluir está o fato de que afirmações políticas podem não valer, em Brasília. Alguém sempre perguntará se a moda pegar e o próprio Lula, depois de centenas de rejeições sobre a hipótese do terceiro mandato, ceder também ao império das circunstâncias?
Orgasmos infinitos
Está longe de encerrar-se o festival Barack Obama. Deverá durar meses, preenchendo o vazio das telinhas e de incontáveis páginas de jornal. Nada mais natural, o homem chega à presidência dos Estados Unidos com centenas de bons propósitos e de planos para enfrentar problemas diversos.
O que parece meio ridículo é a forma de como se tem comportado apresentadores, repórteres e comentaristas da televisão, nos variados telejornais e canais. Dão a impressão de estar em transe, em orgasmos infinitos, sorrindo mais do que o novo presidente e dona Michelle. Elogios sem fim, caras e bocas plenas de felicidade e exaltação, próprias para os dois milhões que nas ruas de Washington assistiram à posse, terça-feira, mas exageradas para quem, diante das câmeras, precisaria demonstrar sobriedade.
Seria espontânea essa representação? Quem sabe ditada pelos mandachuvas das emissoras? Pelos anunciantes? Pelas pesquisas? Tanto faz, mas a verdade é que a generalização desses excessos começam a incomodar o telespectador.
Silêncio governamental
As demissões continuam especialmente na indústria. Voz isolada na Esplanada dos Ministérios, Carlos Lupi, do Trabalho, insiste em que deveriam conter-se as empresas, em especial aquelas beneficiadas com créditos e ajuda direta e indireta do governo. Pelo jeito, não bastam os apelos do ministro do Trabalho.
Onde se encontram, porém, os demais ministros e o próprio presidente da República? Talvez preparando medidas de combate à crise econômica, mas seria bom que se manifestassem. Calados, dão à impressão no mínimo de impotência diante do horror. Quem sabe até de concordância. Onde está, por exemplo, Dilma Rousseff, candidata óbvia à sucessão de 2010? Mais do que os outros, começa a ser cobrada.
A debandada
Quantos ministros são potenciais candidatos aos governos estaduais? Hélio Costa, das Comunicações, em Minas. Patrus Ananias, da Integração Social, também. Geddel Vieira Lima, da Integração Nacional, na Bahia. Armando Nascimento, dos Transportes, no Amazonas. Tarso Genro, da Justiça, no Rio Grande do Sul, da mesma forma como Nelson Jobim, da Defesa. Edison Lobão, das Minas e Energia, no Maranhão. Fernando Haddad, da Educação, em São Paulo. Carlos Lupi, do Trabalho, no Rio. Henrique Meirelles, do Banco Central, em Goiás. Paulo Bernardo, do Planejamento, no Paraná. E outros.
O último dia de março do ano que vem será o limite para os ministros-candidatos se desincompatibilizarem. Sem falar na ministra Dilma, da Casa Civil, se sua candidatura presidencial decolar.
A pergunta que se faz é se o presidente Lula aguardará o prazo fatal ou irá antecipando as substituições para este ano. Afinal, 2010 será crucial para a imagem de seu governo, dificilmente podendo ser tocado por ministros-tampões, secretários-gerais ou tecnocratas. Há quem preveja para o segundo semestre uma recomposição ministerial ampla, mas um problema se coloca: não será na política, muito menos no Congresso, que o presidente encontrará substitutos, pelo mesmo motivo das eleições gerais. Um ministério técnico teria pouco charme.
Nenhum comentário:
Postar um comentário