quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

O PMDB jogou o futuro pela janela


BRASÍLIA - Houve tempo em que o velho MDB e mais tarde o PMDB encarnavam as esperanças do sentimento democrático nacional. Um partido para ninguém botar defeito, responsável pela queda da ditadura e a reconstrução institucional do País. Servia de bússola e ponto de referência para todos. Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Teotônio Vilela, Thales Ramalho, Pedro Simon, os "autênticos" e quantos mais engrandeciam a prática política?

Interligava-se o PMDB aos anseios da população por não ser radical e, muito menos, por não pretender-se dono das verdades absolutas. Era o partido do debate, onde sempre vencia o melhor.

Hoje, é um desastre. A legenda desligou-se de suas bases e transformou-se num aglomerado quase sempre fisiológico.

Prova maior está no resultado da reunião de ontem, de sua bancada no Senado, para escolher o novo presidente da casa. José Sarney não quis, venceu Garibaldi Alves. Nada contra ele, em termos pessoais, não fosse o resultado de pesquisa revelada também ontem, feita junto a 13 mil filiados peemedebistas em todo o País. Sarney recebeu 13%, mesmo sem ser candidato, Garibaldi 3%, os outros não passaram de 1%.

No entanto, nessa consulta livre e descompromissada, Pedro Simon obteve 72% das preferências. Como, então, justificar que, na bancada, Garibaldi Alves recebesse 13 votos, e Pedro Simon, seis votos? A explicação é simples: os representantes do PMDB não representam coisa alguma. Muito menos o partido.

Cada vez mais, desligaram-se de suas bases, mesmo sabendo que nas oposições o nome de Pedro Simon conquistaria quase a unanimidade e teria condições, assim, de recompor a desgastada imagem do Senado. Pesou na maioria dos senadores do PMDB o medo de enfrentar um presidente disposto a renovar costumes e extinguir privilégios. Vai continuar tudo como estava, ou seja, no fundo do poço.

O ex-governador gaúcho nunca foi homem de encobrir a realidade. Atribuiu sua derrota na bancada à discriminação de três pessoas: o presidente Lula, o ex-presidente José Sarney e o líder Waldir Raupp. Com humor, acrescentou que nem sua mulher votaria nele, se fosse senadora. Afinal, no cargo, marcaria sessões deliberativas às segundas e sextas-feiras e, não raro, aos sábados.

Descontaria os vencimentos dos faltosos. Proibiria viagens de senadores ao exterior, pagas pelo Senado. Manteria postura de independência diante do Executivo. Jamais de submissão. Acima de tudo, porém, retiraria das gavetas emboloradas do Senado projetos de extrema necessidade, que os dirigentes da casa escondem faz muito, por contrariarem seus interesses. Mais uma vez o PMDB jogou pela janela as expectativas de suas bases. Por isso elas diminuem a cada eleição.

A coisa mais extraordinária...

Exagerou o presidente Lula ao declarar, em Buenos Aires, ser Evo Morales "a coisa mais extraordinária que aconteceu na América do Sul, porque ele é a cara da Bolívia". Convenhamos, o homem pode ser excepcional, mas acaba de arrancar mais dois mandatos, de uma Assembléia Constituinte onde a oposição não chegou a tempo para participar da votação final. Quer dizer, Morales completará seu atual período de governo dentro de dois anos e, depois, terá direito a mais dois, ou seja, deixará o governo em 2018.

Será a coisa mais extraordinária por conta disso? Ou porque ameaçou botar a Petrobras para fora de seu território e mandou avisar o governo brasileiro de que não deve contar com um único galão a mais de gás, mesmo aquele a ser produzido com recursos da estatal brasileira?

Foi adiada para a próxima semana a visita de Lula a Morales, em La Paz, quando, de chapéu na mão, tentará um refluxo na disposição do companheiro. Chamar o presidente da Venezuela de "rei do petróleo", como também fez o nosso presidente, é aceitável como ironia, mas Evo Morales será rei do quê? Por enquanto, rei da chantagem...

Os derrotados

Quem será derrotado hoje, no Senado, pela votação da CPMF? Qualquer que seja o resultado, perderão todos.

A começar pelo governo, se a maioria dos senadores rejeitar a prorrogação do imposto do cheque. Mas o governo também será derrotado caso consiga aprovar a emenda constitucional, porque, para tanto, terá cedido a todo o tipo de pressões dos senadores, fazendo favores, nomeações e liberando verbas. A Praça dos Três Poderes transformou-se num vasto balcão de negócios, revelando que nada mudou desde que o Brasil descobriu a Oração de São Francisco: é dando que se recebe continua prática inalterada, fator de desmoralização do poder público, tanto faz se por iniciativa do Legislativo ou do Executivo.

Derrotado da mesma forma será o PT, porque anos atrás desenvolveu verdadeira guerrilha parlamentar ao insurgir-se contra a CPMF. Perdeu para Fernando Henrique Cardoso, mas perderá agora, de novo, quando suas bancadas votarem a
favor. Metamorfose ambulante está aí mesmo.

Pelo mesmo raciocínio, perderão PSDB e DEM, antes defensores ferrenhos e agora adversários implacáveis da contribuição que deveria ser provisória. Aprovada ou rejeitada a prorrogação, tucanos e demos não terão como justificar-se perante a opinião pública.

Vale o mesmo para os senadores dos partidos ditos da base oficial, aqueles que ainda hoje estão barganhando seus votos. Poderão ser a favor ou contra a CPMF, cujo conteúdo pouco lhes interessa, atendidas ou proteladas suas reivindicações fisiológicas.

Agora, querem saber quem fica com a mãe de todas as derrotas? A saúde pública, para a qual deveriam fluir integralmente os bilhões do imposto. Basta visitar a imensa maioria dos hospitais públicos...

Fonte: Tribuna de Imprensa Online

http://www.tribuna.inf.br/coluna.asp?coluna=chagas

Nenhum comentário: